Poema de Maria Lucília Meleiro
Publicado inicialmente, em 2014 - numa edição bilingue - no livro Flor do Caos (Editora Apenas Livros), o poema À Mãe-Maior em Placas de Xisto Gravada, da autoria de Maria Lucília Meleiro evoca os achados arqueológicos de deusas pré-históricas gravadas em placas de xisto que impressionaram a autora, anos atrás, após uma visita ao Museu Nacional de Arqueologia - e a outros museus arqueológicos - e, também, a partir da leitura apaixonada de obras de teor arqueológico. Como refere: ninguém pode ficar indiferente ao impacto de tais preciosidades, cujas origens se perdem na noite dos tempos e são o testemunho da história da humanidade! Por estas razões e mescla de emoções ao visitar a exposição Ídolos. Olhares Milenares veio-lhe de imediato ao pensamento o poema que tinha escrito que resolveu gentilmente disponibilizá-lo ao M.N.A. como figura de convite para a presente exposição. Facto que agradecemos emocionados.
Placas de xisto gravadas
com deusas-mãe e franjas pré-históricas
Senhoras do silêncio
Senhoras da memória e do esquecimento
onde tudo finda e tudo começa
onde termina o tormento do amor não saciado
e começa o tormento maior do amor saciado
No finito do infinito
No desejado indesejável
graças à Mãe-Maior
Esquecidos de tudo, unidos no deserto
esta é a Mãe, deusa gravada
em placas de xisto
com franjas pré-históricas
que estende para nós as mãos
e nós dela recebemos
o penhor da palavra emudecida
dos discursos sem palavras
caminhamos na ignorância e na sabedoria
falando de coisas banais
dilacerados e ilesos
aí começa o vasto e incompreensível
oceano do infinito
morada sem limites e sem fim
das deusas gravadas em placas de xisto
com franjas pré-históricas
in Maria Lucília F. Meleiro, Flor do Caos (Apenas Livros, 2014)
Maria Lucília F. Meleiro é natural de Lisboa e licenciada em Filologia Germânica pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa. Fez pós-graduações e mestrados em Desenvolvimento Pessoal e Social, com uma tese sobre Desenvolvimento e Imaginação e em Literatura Inglesa com uma tese sobre Thomas Browne.
Lecionou Inglês e Alemão durante alguns anos, no Liceu Pedro Nunes, traduziu vários romances, e a sua obra divide-se entre o ensaio, a ficção e a poesia. Durante algum tempo participou também em exposições coletivas e individuais de pintura, tendo-se dedicado em seguida exclusivamente à escrita. É membro da direção da C.E.A.E. (Centro de Estudos Arqueológicos e Etnológicos), da A.P.E. (Associação Portuguesa de Escritores) e da S.P.A. (Sociedade Portuguesa de Autores). Fez parte do corpo redatorial da revista Osíris durante três anos.
Publicou um ensaio sobre a Mitologia dos Povos Germânicos (Presença, 1994) e quatro romances históricos situados em várias épocas: A Rosa de Alexandria (Presença, 2002), Iraque, o Pranto de Ishtar (Ésquilo, 2010), As Máscaras da Paixão (Ésquilo, 2013), A Última Mensagem, além de algumas peças e adaptações para o teatro. A sua obra está traduzida em várias línguas e a sua poesia está dispersa por várias antologias e foi distinguida, em 2015, com a Menção Honrosa da C.M.L. E mais recentemente com dois prémios literários em Franca – Prémio AMAVICA 2019 (Capestang) e da Communauté des Communes (Narbonne) 2019.
Ilustrações do livro de SIRET, Louis - Religions néolithiques de l'Ibérie, 1908